Solenidade de Cristo Rei: O valor da palavra “reinar”

Pe. Carlos Padilla

Gosto dessa festa em que o Reino de Deus está no centro. Jesus reina sobre mim, sobre a terra e no céu: “Pois é preciso que ele reine, até que todos os seus inimigos estejam debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte. E, quando todas as coisas estiverem submetidas a ele, então o próprio Filho se submeterá àquele que lhe submeteu todas as coisas, para que Deus seja tudo em todos” [1]. Um Reino ao fim do caminho no qual Deus será tudo em todos. Isso é possível? Para Deus não há impossível.

Eu me coloco nas mãos de Deus para que ele reine em mim: e quanto isso me custa! Muitas vezes, não quero que Deus reine, porque eu mesmo quero reinar. O poder, o bendito poder. A possibilidade de comandar, de outros fazerem o que eu quero, de se adaptarem aos meus planos e de me servirem. Foi assim que me ensinaram o valor da palavra reinar. Aquele que reina manda, decide, governa, tem influência, é respeitado, admirado, seguido. Esse é o conceito de poder que me foi transmitido por anos. Esse reinado é o que imagino quando penso em um rei. Mas Jesus não é assim.

Jesus me desconcerta

Sua forma de reinar me desconcerta nesta festa. Seu trono é a cruz, sua coroa é de espinhos, seu exército são anjos, seu poder é o amor. Não celebro hoje o poder de Jesus, mas a sua impotência manifestada ao longo de sua vida terrena. Outro dia eu lia que: “Jesus vem de Deus, não com poder e glória, mas como um cordeiro indefeso e inerte. Ele nunca se imporá pela força, nunca forçará ninguém a crer Nele. Um dia será sacrificado em uma cruz. Aqueles que quiserem segui-lo o aceitarão livremente” [2].

Seu poder se converte em serviço. Sua onipotência passa a ser uma triste impotência. Seu governo é a entrega de um escravo, um serviço que o leva à morte e a ser o último de todos. Um poder centrado no amor, aquele que mais ama é aquele que mais serve, aquele que mais reina. Tudo tão distante de minhas imagens guardadas na alma. Aquelas imagens de reis poderosos. Fiquei naquele jogo de tronos em que o mais forte vence e subjuga a todos. O rei mais poderoso, aquele que tem mais influência….

Quando temos poder em nossas mãos, como agimos?

Atualmente fala-se muito sobre o abuso de poder. O poder que me foi dado, o poder que foi colocado em minhas mãos. Sempre me recordo de uma frase que ouvi há muito tempo: “Dê poder a um homem e saberás como ele é”. É verdade. Quando tenho poder, quando posso comandar, o melhor e o pior de minha alma vêm à tona. Posso fazer do meu poder um serviço para as pessoas que me foram confiadas ou posso usar minha posição, meu posto, meu status para oprimir os fracos, para tirar vantagem dos vulneráveis. O melhor ou o pior sairá de mim, dependendo de como eu o compreendi.

Algumas pessoas levam uma vida amargurada porque nunca têm tanto poder quanto gostariam. Há outras que detestam ter poder e preferem ocupar cargos mais baixos e não assumir a responsabilidade do poder. Aprender a comandar é uma arte, uma responsabilidade. Aprender a servir é um caminho de santidade. Usar bem meu poder quando me coloco a servir é o caminho. Não esperar que me escutem, que me obedeçam, que me levem em conta, que façam o que eu desejo, que obedeçam às minhas ordens. É tão básico o coração humano, tão simples.

Preciso que me escutem e me sigam – o poder da influência. Quando não sou valorizado, quando não sou procurado, quando não sou respeitado, sinto que minha vida não tem valor. Esqueço que o verdadeiro poder está em meu amor. Em meu amor há uma força oculta que supera tudo. O verdadeiro reinado é o do amor, um amor que serve, que exalta o amado, que o busca e o coloca no centro de tudo. Quando busco a felicidade daquele a quem sirvo, tudo muda. Não busco a mim mesmo, não estou eu no centro.

Reinar é sinônimo de servir

Os poderosos da Terra parecem ser os que comandam. Os que têm dinheiro e posição respeitável. Desde criança, me disseram que eu deveria procurar esses lugares para influenciar, para mudar este mundo. Parece somente a partir desses lugares importantes é que poderia fazer alguma coisa. Tudo é vaidade, tudo passa, de pouco serve.

O poder de Jesus, seu reino, esteve em jogo na hora da dor, na noite escura na masmorra, naqueles gritos que condenavam aquele que os havia amado. E eles responderam com ódio ao amante. A verdade só será conhecida no céu. Enquanto isso, só tenho que me dedicar a servir. Não esperar que eles aceitem tudo o que eu faço e digo. Que respeitem minhas posições de poder. Que valorizem meu serviço generoso. Isso não está em minha mão. O que posso fazer é servir a partir de minha posição.

A partir do respeito que os outros têm por mim, começo um caminho de serviço aos homens. Não quero tirar proveito de meu poder. Não pretendo beneficiar aos meus. Não quero que minha opinião seja sempre respeitada e seguida. O Reino de Jesus é o da pobreza, da humildade, da pequenez e do abandono. O poder de Jesus se manifesta em sua morte na cruz. Nesse amor solitário, que se entrega nas mãos de seu Pai. Assim é o verdadeiro reino para o qual ele me chama.

 

*Pe. Carlos Padilla Esteban, trecho da homilia de 22 de novembro de 2020. Para ler o texto completo, em espanhol, clique aqui.

[1] 1 Coríntios 15,25-26.28
[2] José Antonio Pagola, Arturo Asensio Moruno, El camino abierto por Jesús.

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